O zumbido silencioso de uma revolução industrial verde

Em meio a preocupações climáticas urgentes, uma tecnologia inovadora pode ser a chave para a descarbonização da indústria siderúrgica.

No laboratório de P&D da Boston Metal em Woburn, Massachusetts, os cientistas usam eletricidade para separar o ferro de seu minério sem liberar dióxido de carbono. Foto de Julia Schmalz/IFC.

No laboratório de P&D da Boston Metal em Woburn, Massachusetts, os cientistas usam eletricidade para separar o ferro de seu minério sem liberar dióxido de carbono. Foto de Julia Schmalz/IFC.

Um prédio de escritórios na periferia de Boston está sendo o palco de uma revolução silenciosa.

Lá, num galpão imaculadamente limpo, em meio a um complexo emaranhado de maquinários, tubos de metal e painéis elétricos, os cientistas estão aperfeiçoando uma tecnologia que pode mudar a trajetória do mundo industrial moderno, dando-nos a capacidade de produzir aço limpo e “verde".

Os altos-fornos tradicionais emitem milhões de toneladas de gases tóxicos de efeito estufa na atmosfera. Em vez disso, os cientistas da Boston Metal usam eletricidade limpa e renovável para converter minério de ferro em aço. A tecnologia, conhecida como eletrólise de óxido fundido (MOE, na sigla em inglês), cria aço sem que haja a liberação de dióxido de carbono, abrindo um possível caminho para tornar mais verde um dos setores cujas emissões são mais difíceis de reduzir (entre diversos setores intensivos em carbono com poucas alternativas claras e viáveis de baixas emissões).

Sede da Boston Metal em Woburn, Massachusetts. Foto da Boston Metal.

Sede da Boston Metal em Woburn, Massachusetts. Foto da Boston Metal.

“Estamos escrevendo um novo capítulo sobre a siderurgia”, disse Tadeu Carneiro, CEO da Boston Metal, um veterano do setor que, após se aposentar no Brasil, resolveu voltar ao mercado para liderar a startup. “Isso é realmente revolucionário.”

Poucos materiais neste planeta são mais essenciais que o aço. Essa liga preciosa constitui a espinha dorsal da sociedade moderna: é um elemento fundamental das edificações em que vivemos, dos veículos que nos transportam e dos maquinários que nos alimentam. No mundo todo, a indústria siderúrgica produz cerca de 2 bilhões de toneladas de aço por ano, o suficiente para construir mais de 24 mil pontes como a Golden Gate, ou 30 edifícios como o Empire State.

Apesar de sua função como elemento crucial para a construção de nosso mundo moderno, o aço também tem papel central na deterioração gradual da Terra. O processo queima o coque (um material derivado do carvão) em altos-fornos que exalam carbono. Ele é responsável por até 8% das emissões globais anuais de gases de efeito estufa. Se a trilionária indústria siderúrgica fosse um país, seria o quinto maior emissor do planeta.

“Não podemos dar às costas à missão de descarbonizar o aço.”
Tadeu Carneiro, CEO, Boston Metal

Devido ao aumento das preocupações climáticas e à previsão de que a produção de aço aumente em um terço até 2050, a corrida rumo ao aço verde já começou. Em nenhum outro lugar isso é mais premente que nos mercados emergentes, onde a rápida urbanização está impulsionando a demanda por aço. Esses países precisam industrializar suas economias para satisfazer as necessidades básicas de suas populações crescentes, ao mesmo tempo que mantêm sob controle suas metas de emissões.

Tadeu Carneiro, CEO da Boston Metal. Foto de Julia Schmalz/IFC.

Tadeu Carneiro, CEO da Boston Metal. Foto de Julia Schmalz/IFC.

“Quando nos perguntamos onde a necessidade de aço vem crescendo, tudo nos direciona aos países em desenvolvimento”, disse William Sonneborn, diretor global de Tecnologias Disruptivas, Indústrias Criativas e Fundos da Corporação Financeira Internacional (IFC).

“Para se urbanizarem, os países da África, da América Central e do Sudeste Asiático precisam de toda a produção incremental de aço que puderem obter. Medidas que visem permitir que tais mercados passem diretamente para a produção de aço com zero carbono podem ser extremamente poderosas”, disse ele.

Em maio de 2023, a IFC aprovou um investimento de capital de US$ 20 milhões na Boston Metal com o propósito de apoiar o próximo passo da empresa para a comercialização de sua inovadora tecnologia MOE. É a primeira vez que o braço do setor privado do Banco Mundial investe numa startup antes que comece a gerar receitas. Isso revela o comprometimento da instituição no sentido de ajudar os mercados emergentes a evitar a dispendiosa transição de combustíveis fósseis para energias renováveis, ao mesmo tempo que ajuda a criar setores industriais de baixo carbono mais resilientes desde o início. No início de setembro, a Boston Metal anunciou o encerramento de sua rodada de financiamento de série C, elevando o total da série para US$ 262 milhões.

O projeto é um dos primeiros investimentos da IFC em tecnologia profunda, uma categoria de startups que buscam desenvolver e comercializar descobertas complexas em ciência ou engenharia com o objetivo de resolver alguns dos problemas mais desafiadores do mundo em áreas como mudanças climáticas, saúde humana e acesso à energia.

Katie Rae, CEO da The Engine. Foto de Tony Luong.

Katie Rae, CEO da The Engine. Foto de Tony Luong.

Segundo Katie Rae, a "tecnologia profunda (ou dura) é fundamental na luta contra as mudanças climáticas". Katie Rae é CEO do fundo de capital de risco The Engine, especializado em empresas em estágio inicial que buscam resolver alguns dos maiores problemas do mundo. Ela e sua equipe levaram as inovações da Boston Metal à atenção da IFC. "Transformações reais só podem ser incentivadas por um tipo muito diferente de verde", ela disse.

“Não conseguiremos resolver os problemas das mudanças climáticas com software. Orar aos deuses dos baixos custos iniciais de capital não servirá para nada”, disse Rae, que faz parte do Conselho da Boston Metal. “Temos de explorar medidas e inovações capazes de provocar mudanças fundamentais nas estruturas de custos, nas estruturas de carbono e num novo conjunto de infraestruturas.”

“Temos de nos esforçar como uma sociedade global”, disse ela. “A tecnologia profunda e os grandes avanços são o caminho e a resposta.”

Donald Sadoway, inventor da tecnologia MOE da Boston Metal, próximo à célula MOE semi-industrial da empresa. Foto de Julia Schmalz/IFC.

Donald Sadoway, inventor da tecnologia MOE da Boston Metal, próximo à célula MOE semi-industrial da empresa. Foto de Julia Schmalz/IFC.

O caminho científico menos trilhado

Quando era um jovem professor assistente em Boston, no início da década de 1980, Donald Sadoway sentiu-se atraído pelo fascínio da eletrometalurgia, o processo de utilização da eletricidade para a extração de metais. Em seu laboratório no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), Sadoway começou a pesquisar o uso de ânodos inertes — bloco usado para conduzir eletricidade durante o processo de fundição — na fabricação de alumínio. No final da década, Sadoway estava convencido de que, com o ânodo inerte, a eletricidade seria a chave para descarbonizar não apenas o processo de fundição de alumínio, mas também, por extensão, a produção de aço. Contudo, apesar dos avanços, havia ainda pouco interesse externo em suas ideias.

"Ninguém queria patrocinar a pesquisa”, disse Sadoway, que atualmente é professor emérito da cátedra John F. Elliott de Química de Materiais no MIT.

Em 1998, Sadoway foi abordado pela NASA para procurar maneiras de produzir oxigênio na Lua. Há duas décadas, ele já vinha experimentando sua nova tecnologia — que chamou de eletrólise de óxido fundido — com outros metais. Usando materiais semelhantes aos encontrados no solo lunar (obtidos na Cratera do Meteoro, no Arizona), Sadoway descobriu que o óxido de ferro no solo produzia oxigênio em abundância e que poderia produzir aço como subproduto.

Ao longo de décadas de pesquisa, Sadoway nunca duvidou de sua ideia original de que “descarbonização significa eletrificação". Foto cortesia do MIT.

Ao longo de décadas de pesquisa, Sadoway nunca duvidou de sua ideia original de que “descarbonização significa eletrificação". Foto cortesia do MIT.

No entanto, havia um problema: o processo usava um ânodo feito de irídio — um metal precioso e caro, inadequado para a produção de aço em grande escala. Sadoway persistiu em suas pesquisas e, em 2010, em colaboração com o pós-doutorando Antoine Allanore, conseguiu avançar.

Ao substituir o ânodo de irídio por outro mais barato, feito de cromo e ferro, Sadoway e Allanore demonstraram que a tecnologia MOE poderia produzir um aço econômico e livre de emissões. Os resultados foram publicados num artigo de referência na revista Nature em 2012. No ano seguinte, Sadoway, Allanore e outro cientista do MIT, James Yurko, fundaram a Boston Metal.

O processo científico levou várias décadas e, ao longo do caminho, Sadoway teve de enfrentar o ceticismo de seus pares. Todavia, nunca duvidou de sua ideia original de que “descarbonização significa eletrificação”.

“As pessoas diziam que eu tinha ficado louco, mas eu sabia que meus cálculos estavam corretos”, disse Sadoway, que se aposentou em 2022 após 45 anos lecionando no MIT. “Procuro sempre o caminho menos trilhado. Não gosto de simplesmente seguir o rebanho.”

“Gostaria muito de dar aos países [em desenvolvimento] uma tecnologia que lhes permitisse produzir aço em seus próprios territórios, utilizando seus próprios recursos, com seus próprios trabalhadores. Dessa forma, podem se tornar criadores de seu próprio futuro.”  
Donald Sadoway, inventor da tecnologia MOE

A Boston Metal é capaz de produzir aço verde usando minério de ferro de baixa qualidade. Foto de Julia Schmalz/IFC.

A Boston Metal é capaz de produzir aço verde usando minério de ferro de baixa qualidade. Foto de Julia Schmalz/IFC.

O zumbido silencioso de uma nova revolução industrial

Visitar a sede da Boston Metal, situada num prédio comercial a cerca de 20 quilômetros a noroeste de Boston, é como entrar no set de gravação da série The Office. Assim como a empresa fictícia de comércio de papel da série, localizada em Scranton, Pensilvânia, o campus Woburn da Boston Metal (uma homenagem aos trabalhadores americanos do pós-guerra) é composto por prédios retangulares baixos, cercados por estacionamentos de asfalto com poucas árvores.

No entanto, ao entrarmos na Boston Metal, qualquer comparação com a irreverente série cômica desaparece imediatamente.

Ao lado de um escritório onde simpáticos funcionários examinam monitores de computador e conversam em bolhas com isolamento acústico, fica o centro de pesquisa da empresa e a siderúrgica-piloto. O espaço — que abriga quatro estágios-piloto diferentes da tecnologia MOE — é impecavelmente limpo e, para uma usina siderúrgica, estranhamente silencioso. O único ruído audível emana de um enorme ventilador industrial de teto.

Durante uma recente visita às instalações, Guillaume Lambotte, cientista-chefe da Boston Metal, apresenta, com sua fala mansa, um resumo da missão de descarbonização da empresa. Nas telas dos computadores do laboratório de pesquisa, Lambotte aponta para as bolhas de oxigênio que sobem, como num brinquedo, dentro das células em miniatura, enquanto o minério de ferro em seu interior é reduzido a ferro líquido.

Guillaume Lambotte, cientista-chefe da Boston Metal, no laboratório de Pesquisa e Desenvolvimento da empresa. Foto de Julia Schmalz/IFC.

Guillaume Lambotte, cientista-chefe da Boston Metal, no laboratório de Pesquisa e Desenvolvimento da empresa. Foto de Julia Schmalz/IFC.

Ao lado, na usina experimental, está a galinha dos ovos de ouro da empresa: a célula semi-industrial de 25 mil ampères — que, para olhos destreinados, parece uma lixeira eletrificada. Atrás da célula há um mural de complexos painéis elétricos onde a eletricidade limpa e renovável é convertida e depois viaja, como uma corrente, para o interior da célula localizado acima. Lá, um ânodo inerte é imerso num eletrólito contendo minério de ferro. Quando a célula atinge a temperatura de 1.600 °C, os elétrons rompem as ligações do óxido de ferro no minério, resultando em ferro líquido limpo e com alto grau de pureza, que pode ser retirada da parte inferior da célula.

Essa célula semi-industrial — aproximadamente do tamanho de um ônibus escolar — é o que coloca a Boston Metal à frente de seus concorrentes, dizem especialistas e investidores. Embora tenhamos visto outros avanços importantes em modelos de descarbonização do aço no mundo todo, principalmente com o uso de tecnologias movidas a hidrogênio e outras tecnologias com alta eficiência energética, a modularidade única da Boston Metal — ou seja, a capacidade de construir células MOE em qualquer lugar, em pequena ou grande escala — faz com que essa tecnologia se torne especialmente atraente para os mercados emergentes com amplo acesso a energias renováveis.

Embora análises recentes indiquem que o custo para tornar o aço mais ecológico será alto, a tecnologia MOE requer um volume significativamente menor de despesas de capital iniciais. Sua abordagem modular e escalável dá aos fabricantes de aço a capacidade de adicionar células conforme a necessidade.

“A modularidade da tecnologia faz com que os custos iniciais de capital sejam mais baixos e promove um equilíbrio mais fácil entre oferta e procura”, disse William Sonneborn. “Se seu país é pequeno, não precisa de uma usina siderúrgica gigantesca. A tecnologia MOE permite que você construa sua própria usina em vez de importá-la de outro lugar. É por isso que essas células, que podem ser montadas e movidas facilmente, são tão atraentes.”

De volta à usina-piloto em Woburn, Lambotte abre a tampa de um grande barril de metal preto. Dentro, há um pó grosso de cor ocre: ele explica que é minério de ferro, o material básico para a fabricação do aço. Embora a maioria das tecnologias de produção de aço exija a utilização de minério de alta qualidade, a tecnologia MOE da Boston Metal pode usar minério de qualidade inferior, outra vantagem importante para os mercados emergentes.

“A tecnologia MOE é igualmente eficiente com minério de ferro de baixa qualidade”, disse Sonneborn. “Tomemos como exemplo um país como o Togo, que tem bastante minério de ferro de baixa qualidade. Antes, se quisesse fabricar seu próprio aço, o país teria de importar o minério da Austrália ou do Brasil. Agora, pode usar a tecnologia da Boston Metal.”

“In “Para se urbanizarem, os países da África, da América Central e do Sudeste Asiático precisam de toda a produção incremental de aço que puderem obter. Medidas que visem permitir que tais mercados passem diretamente para a produção de aço com zero carbono podem ser extremamente poderosas.
William Sonneborn, diretor global da IFC para Tecnologias Disruptivas, Indústrias Criativas e Fundos

Instalação de metais de alto valor perto de São João del Rei, Minas Gerais, Brasil. Vídeo da Boston Metal.

Instalação de metais de alto valor perto de São João del Rei, Minas Gerais, Brasil. Vídeo da Boston Metal.

Transformação da geografia global do aço

Antes de ingressar na equipe da Boston Metal em 2017, o CEO Tadeu Carneiro, engenheiro metalúrgico, passou toda a sua carreira na CBMM, a maior produtora mundial de nióbio, com sede no Brasil. Quando chegou a hora da aposentadoria, Carneiro e a esposa resolveram fazer as malas e ir para a praia. Só pretendiam parar rapidamente em algum lugar para comprar pijamas.

“Nem chegamos à loja”, ri Carneiro, lembrando-se do telefonema que recebeu quando foi convidado para liderar a Boston Metal. “Troquei o ensolarado Brasil pela linda Boston. Não podemos dar às costas à missão de descarbonizar o aço.”

A expansão da tecnologia MOE da Boston Metal nos mercados emergentes, que têm amplo acesso a energias renováveis, representa uma oportunidade para mudar toda a geografia global da siderurgia, disse Carneiro.

Tadeu Carneiro sobre como a tecnologia MOE da Boston Metal pode mudar a geografia global do aço [Em Inglês].

No passado, os gigantes mundiais da produção de aço prosperaram devido a seu acesso a minas de carvão, jazidas de minério de ferro e transporte marítimo ou ferroviário. A adoção do modelo verde de fabricação de aço da Boston Metal seria especialmente benéfica para os mercados emergentes com altas concentrações de energia renovável.

“À medida que nos afastarmos da era do carbono e das emissões de CO2, as siderúrgicas se deslocarão para onde houver eletricidade verde”, disse Carneiro. “A geografia do aço pode mudar dependendo do local onde forem disponibilizadas fontes mais verdes de energia elétrica.”

Carneiro aponta para seu país natal, o Brasil, que possui a maior oferta de energia renovável e as maiores reservas de minério de ferro da América Latina. Em 2023, a Boston Metal inaugurou sua primeira unidade de produção no país, onde a tecnologia MOE é utilizada para extrair metais de alto valor — a começar pelo estanho, nióbio e tântalo — provenientes de resíduos da mineração. Essa é outra grande vantagem oferecida pela tecnologia MOE, capaz de gerar um fluxo de receitas crucial. O investimento da IFC na empresa será utilizado, em parte, para apoiar essa unidade de produção.

Em 2025, a Boston Metal planeja ter sua primeira usina-piloto comercial em funcionamento. Quando a atividade estiver totalmente comercializada, a empresa licenciará sua tecnologia de aço verde. A meta é comercializar até 2026. A IFC trabalhará, então, com Carneiro e a empresa para acelerar a adoção da tecnologia em vários mercados emergentes predefinidos. Alguns desses mercados são o Brasil, a Índia, a Turquia, a Indonésia, a Nigéria e o Egito, que se beneficiam da disponibilidade de minério de ferro, de seu potencial de eletricidade renovável e de sua capacidade atual de produção de aço, além do apoio do governo e da existência de políticas de tecnologias limpas.

Posicionamento do setor rumo a um futuro neutro em carbono

A indústria siderúrgica está atenta.

Dez dos principais produtores de aço estão comprometidos com a redução de carbono no curto prazo, e os consumidores exigem, cada vez mais, que o aço se torne mais limpo. Logo, a indústria está sob pressão para "limpar" seus processos altamente poluentes.

A ArcelorMittal, o segundo maior império siderúrgico do mundo, posicionou-se como líder global na descarbonização do aço. O CEO Aditya Mittal, que assumiu a empresa de seu pai, Lakshmi Mittal, no início de 2021, prometeu que a empresa reduzirá a intensidade de carbono do aço que produz em 25% até 2030.

Irina Gorbounova, diretora do Fundo de Inovação XCarb da ArcelorMittal.

Irina Gorbounova, diretora do Fundo de Inovação XCarb da ArcelorMittal.

No início deste ano, a ArcelorMittal investiu US$ 36 milhões na primeira rodada de financiamento de série C da Boston Metal, o maior investimento individual da empresa até o momento. Isso foi feito por meio de seu Fundo de Inovação XCarb, que busca identificar as tecnologias de descarbonização do aço que possuam o melhor potencial.

Para Irina Gorbounova, diretora da XCarb Innovation, a tecnologia da Boston Metal satisfaz vários quesitos-chave que a gigante da indústria procura ao abordar inovações na descarbonização do aço. É capaz de gerar impacto significativo na descarbonização da indústria? É escalável? Quanto é original, e quais são as barreiras à sua entrada no mercado?

Uso da célula MOE em escala-piloto da Boston Metal. Vídeo da Boston Metal.

Uso da célula MOE em escala-piloto da Boston Metal. Vídeo da Boston Metal.

“O fato de termos feito nosso maior investimento inicial por meio do Fundo XCarb na Boston Metal revela as conclusões a que chegamos”, disse Gorbounova, que faz parte do Conselho da Boston Metal. “Quando se trata de descarbonizar a indústria siderúrgica, não existe uma solução que sirva para todos. A Boston Metal desenvolveu uma tecnologia fascinante que acreditamos ter um papel a desempenhar na história e na solução da descarbonização. Queremos apoiar a empresa na implantação e expansão dessa tecnologia”, disse ela.

Gorbounova menciona a Índia, onde a ArcelorMittal está investindo em diversas soluções tecnológicas para o aço verde, como um mercado vantajoso para ampliar a tecnologia MOE. A Índia, o segundo maior produtor de aço bruto do mundo, tem grandes reservas de minério de ferro e abundantes recursos de energia renovável. Até 2050, a expectativa é que quase um quinto do aço produzido globalmente venha da Índia, em comparação com cerca de 5% atualmente.

O alinhamento de sua tecnologia às estratégias de desenvolvimento mundial não passou pela cabeça de Donald Sadoway quando ele começou a realizar experiências com ânodos inertes em seu laboratório em Cambridge, Massachusetts.

Numa visita recente à sede de Woburn, Sadoway, usando capacete e óculos de proteção, examinou as linhas MOE da empresa. Naquela época, lembrou Sadoway, seu foco principal era aperfeiçoar uma maneira mais eficiente de produzir alumínio e aço, e não ajudar a humanidade.

Agora, disse Sadoway, ele está animado com o fato de a tecnologia MOE poder beneficiar as economias dos mercados emergentes que desejem dar um salto em seu desenvolvimento.

"Gostaria muito de dar àqueles países uma tecnologia que lhes permitisse produzir aço em seus próprios territórios, utilizando seus próprios recursos, com seus próprios trabalhadores", ele disse. “Dessa forma, eles podem se tornar criadores de seu próprio futuro.”

Sadoway olha para a célula semi-industrial que pode, com o tempo, virar de cabeça para baixo um processo industrial centenário. “É realmente a ciência a serviço da sociedade.”

 Publicado em Outubro 2023.