Contratação inclusiva abre portas na América Latina

Nova iniciativa de recrutamento da IFC amplia oportunidades para afrodescendentes

Mayra Duarte de Carvalho no escritório da IFC em São Paulo, Brasil. Foto: Davilym Dourado/IFC.

Mayra Duarte de Carvalho no escritório da IFC em São Paulo, Brasil. Foto: Davilym Dourado/IFC.

Mayra Duarte de Carvalho, 31 anos, economista em São Paulo, sempre entendeu que teria que criar sua própria trajetória profissional. Criada na periferia da maior cidade do Brasil, um curso universitário parecia algo muito distante. Como mulher negra, uma das 133 milhões de pessoas em toda a América Latina conhecidas como afrodescendentes, cujos ancestrais foram escravizados em todo o continente, ela não conhecia nenhuma pessoa bem-sucedida na sociedade brasileira que se parecesse com ela. Após ter sido aceita em uma escola de ensino médio de referência e depois em uma universidade pública de prestígio, “eu me acostumei a ser a única pessoa negra na minha classe”, ela diz. “Muitas vezes senti que não pertencia àqueles lugares.” 

Em vez de recuar, Mayra mergulhou nos estudos. Ela buscava uma carreira em uma organização multilateral onde seu trabalho pudesse impactar comunidades como a sua, com acesso desigual a serviços e oportunidades. “Mas sem nenhuma conexão social para me ajudar a conseguir um emprego como esse, parecia um sonho impossível”, ela ri.  

Em qualquer outro ano, ela poderia estar certa. Mas o escritório da IFC no Brasil tinha acabado de lançar seu programa de contratação inclusiva para afrodescendentes, e ela foi selecionada para ajudar a desenvolver projetos de finanças sustentáveis para comunidades carentes. O programa de contratação do Brasil, modelado a partir da iniciativa de destaque da IFC na Colômbia, faz parceria com uma organização sem fins lucrativos local para identificar e recrutar candidatos qualificados de grupos sub-representados para contratos de seis a 12 meses. Na maioria dos casos, os possíveis candidatos não tomariam conhecimento da oportunidade sem esse trabalho de recrutamento. Ao final do programa, os candidatos podem ser considerados para contratos de mais longa duração. Até o momento, nove pessoas participaram dos programas no Brasil e na Colômbia, e a IFC está expandindo-o para toda a América Latina.   

Participantes da primeira turma do programa de contratação inclusiva em Bogotá, Colômbia, com seus colegas da IFC.

Participantes da primeira turma do programa de contratação inclusiva em Bogotá, Colômbia, com seus colegas da IFC.

Iniciativas como essa são necessárias porque, embora um em cada quatro latino-americanos seja descendente de africanos, as oportunidades de carreira para afrodescendentes são extremamente limitadas, segundo Bruno Gomes, cofundador da Rede de Economistas Pretas e Pretos, ou REPP, parceira da IFC.  “A raça ainda impacta significativamente os tipos de oportunidades e o acesso das pessoas ao mercado de trabalho... que é predominantemente ocupado por brancos e pessoas de classes socioeconômicas mais altas”, de acordo com Gomes. “É crucial tomar medidas estratégicas para reduzir essas disparidades. [Trabalhar na IFC] representa uma oportunidade real de mudança.”

Facilitando o acesso

Os programas de contratação inclusiva para afrodescendentes no Brasil e na Colômbia fazem parte de um crescente número de iniciativas da IFC que reconhecem como um ambiente de trabalho diverso, equitativo e inclusivo pode melhorar o desenvolvimento do setor privado, segundo Rani Pooran, líder do programa de DEI na IFC. “O negócio da IFC é a inclusão social e econômica”, diz Pooran. “Construímos soluções com base nesses princípios.”  

Na América Latina, a busca proativa de afrodescendentes amplia o grupo de recrutados para incluir pessoas que talvez não estejam familiarizadas com a IFC ou o Grupo Banco Mundial, afirma Manuel Reyes-Retana, Diretor Regional da IFC para a América do Sul. “Queremos contratar pessoas com novos insights e perspectivas, independentemente de elas virem até nós pelos canais convencionais ou de já terem ouvido falar de nós antes, porque a IFC trabalha em ambientes complexos, difíceis.” 

"[Trabalhar na IFC] representa uma oportunidade real de mudança."
Bruno Gomes, cofundador da Rede de Economistas Pretas e Pretos, ou REPP

Arthur da Silva Ferreira, 28 anos, vem de um desses ambientes difíceis. Criado em uma área rural do sudeste do Brasil, “não havia foco em educação, nem oportunidades de crescimento”, diz ele. “Nossa família enfrentou muitas dificuldades.” 

A sua experiência reflete a de muitos afrodescendentes na América Latina, que têm 2,5 vezes mais probabilidades do que outros latino-americanos de viver em condições de pobreza crônica, de acordo com o Banco Mundial. Um em cada cinco estudantes abandona o ensino fundamental. No entanto, embora tenham o mesmo nível de educação e experiência, eles ganham menos do que seus colegas que não são afrodescendentes pelo mesmo tipo de trabalho em todos os países da América Latina.

No Brasil, onde os afrodescendentes representam mais da metade da força de trabalho, um brasileiro negro ganha cerca de 40% menos que um brasileiro branco, segundo a REPP.  As disparidades salariais aumentam com os níveis mais altos de educação, mostra pesquisa do Banco Mundial, e as lacunas permanecem constantes ou aumentam à medida que os afrodescendentes alcançam níveis mais altos de educação.

A sorte de Arthur mudou quando o governo federal o selecionou para frequentar uma escola de ensino médio de referência, o que abriu caminho para um diploma em economia de uma universidade pública de prestígio. Ele diz que nunca pensou em se candidatar à uma vaga na IFC porque não tinha fluência em inglês. No entanto, por meio da REPP, Arthur descobriu que os candidatos selecionados poderiam fazer cursos de inglês pagos pela IFC para atender o requisito de fluência. Ele foi contratado como analista financeiro em um contrato de prazo prolongado há 12 meses. 

A experiência de Arthur e de outros participantes da iniciativa de contratação inclusiva ajuda a combater preconceitos raciais no local de trabalho, de acordo com Gomes, da REPP.

"O acesso é o primeiro passo para navegar melhor pelas dificuldades sistêmicas", diz Gomes. "Isso só é possível quando damos oportunidades que desafiam a narrativa de que os negros não estão preparados para esses espaços."

Afrodescendentes na América Latina têm 2,5 vezes mais probabilidades do que outros latino-americanos de viver em condições de pobreza crônica, segundo o Banco Mundial.


Arthur da Silva Ferreira no escritório da IFC em São Paulo, Brasil. Foto: Davilym Dourado/IFC.

Arthur da Silva Ferreira no escritório da IFC em São Paulo, Brasil. Foto: Davilym Dourado/IFC.

Mayra Duarte de Carvalho; Gabrielle Lui Santana, representante de DEI no Brasil; e Arthur da Silva Ferreira no escritório da IFC em São Paulo. Foto: Davilym Dourado/IFC.

Mayra Duarte de Carvalho; Gabrielle Lui Santana, representante de DEI no Brasil; e Arthur da Silva Ferreira no escritório da IFC em São Paulo. Foto: Davilym Dourado/IFC.

David Murilla Mosquero no escritório da IFC em Bogotá, Colômbia. Foto: David Vargas/IFC.

David Murilla Mosquero no escritório da IFC em Bogotá, Colômbia. Foto: David Vargas/IFC.

Criando parcerias comunitárias

Para facilitar esse acesso, a IFC conta com a orientação de organizações sem fins lucrativos e grupos de defesa com conexões profundas nas comunidades locais. Assim como a REPP ajudou a moldar o programa de contratação inclusiva da IFC no Brasil, o parceiro colombiano Manos Visibles fornece consultoria sobre a direção geral do projeto, promove o processo de inscrição e faz uma pré-seleção dos candidatos.

Paula Moreno, fundadora da Manos Visibles, em um evento da IFC em 2023 para organizações da sociedade civil, que discutia estratégias para diversidade e inclusão. Foto: Djenno Bacvic/IFC.

Paula Moreno, fundadora da Manos Visibles, em um evento da IFC em 2023 para organizações da sociedade civil, que discutia estratégias para diversidade e inclusão. Foto: Djenno Bacvic/IFC.

A contratação inclusiva na Colômbia demonstra que o setor privado pode “oferecer soluções culturalmente relevantes e impactantes”, diz Giuliana Brayan, Gerente de empoderamento coletivo e gênero na Manos Visibles. 

"A diversidade racial não é apenas um imperativo moral, mas uma vantagem estratégica, pois  permite à IFC impulsionar o crescimento sustentável e ao mesmo tempo dar origem a inovações que refletem a realidade enfrentada pelas comunidades marginalizadas", diz Giuliana. “A liderança da IFC estabelece um novo padrão de inclusão que é urgente para a região.” 

Kleider Alexander Tello Romana, Hayno Takir Murcia Quintero, Jhon Eduar Angulo Viveros e Johan Sebastian Saldarriaga Velasco foram os primeiros quatro participantes da iniciativa de contratação inclusiva da IFC em Bogotá, Colômbia.

Kleider Alexander Tello Romana, Hayno Takir Murcia Quintero, Jhon Eduar Angulo Viveros e Johan Sebastian Saldarriaga Velasco foram os primeiros quatro participantes da iniciativa de contratação inclusiva da IFC em Bogotá, Colômbia.

O programa também agrega valor à perspectiva interna da equipe da IFC, diz Elizabeth Martínez de Marcano, Diretora Regional da IFC para Colômbia, México, América Central e Caribe. “A parceria com a Manos Visibles oferece uma nova perspectiva por meio da qual podemos abordar e implementar projetos. Isso fortalece nossas ofertas aos clientes.”

A liderança da IFC estabelece um novo padrão de inclusão que a região precisa com urgência." 
Giuliana Brayan, Gerente de empoderamento coletivo e gênero, Manos Visibles.

David Murilla Mosquero, analista de dados de 31 anos, chegou ao escritório da IFC em Bogotá por meio da Manos Visibles. Ele admite que demorou para se sentir confortável porque é um dos poucos negros ali.

O lado positivo é que "tive conversas bastante significativas com muitos dos meus colegas de trabalho sobre a dinâmica racial na Colômbia e na América Latina", disse David. "Acho que eles entendem que ser afrodescendente me permite trazer ideias novas para a promoção de investimentos em áreas com afrodescendentes. Isso significa que nós, funcionários [afrodescendentes], temos a oportunidade de contribuir com algo de valor.”

Para mais informações sobre cargos para afrodescendentes e povos indígenas na região da América Latina e do Caribe, clique aqui. Para saber mais sobre o Programa de Jovens Profissionais do Grupo Banco Mundial, clique aqui.

Os programas de contratação inclusiva para afrodescendentes no Brasil e na Colômbia foram desenvolvidos em colaboração com as equipes do Departamento de Recursos Humanos e de DEI (Diversidade, Equidade e Inclusão) da IFC e o  Escritório de Equidade Racial do Banco Mundial.