
As mudanças climáticas não são uma ameaça futura para o povo de Barbados – eles já estão sofrendo suas consequências. Somente nos últimos três anos, tempestades de violência sem precedentes derrubaram a rede elétrica e destruíram estradas; a elevação do nível do mar levou água salgada a poços, ameaçando o abastecimento de água potável e a segurança alimentar; e o aquecimento dos oceanos acelerou o crescimento do sargaço, uma alga marrom viscosa que está colocando em risco a vida marinha e a subsistência dos pescadores. A resiliência climática é agora uma questão de sobrevivência nacional, como afirmou a primeira-ministra Mia Amor Mottley. Aqui estão alguns dos empresários, acadêmicos, ativistas e oficiais do governo que ajudam seu país a enfrentar o desafio.
Moldar o futuro digital da pesca

Shelly-Ann Cox, superintendente de pesca de Barbados, acredita que a tecnologia e os métodos de coleta digital de dados podem dar nova vida à indústria pesqueira, um fator de contribuição extremamente importante para a cultura e a segurança alimentar local. “Muitos pescadores já estão usando equipamentos de GPS e imagens de satélite para ajudá-los a localizar peixes e a monitorar a temperatura da água e as marés”, afirma.
A nova iniciativa DigiFish, um programa colaborativo lançado pelo governo, sociedade civil e setor privado, está introduzindo tecnologia para apoiar o uso dessas e de outras inovações de forma mais sistemática. Por exemplo, dispositivos de rastreamento movidos a energia solar, sistemas de monitoramento de embarcações e balanças inteligentes – com telas sensíveis que exibem o peso, comprimento, categoria e temperatura dos peixes – alimentarão um banco de dados que gera uma etiqueta para peixes considerados rastreáveis e sustentáveis. Isso ajudará os pescadores locais a buscarem acesso a novos mercados, como os da União Europeia, que exigem essas certificações.
Mas Cox nunca se esquece dos pescadores e pescadoras - ou o papel histórico da pesca, que às vezes é considerada uma das primeiras atividades autônomas exercidas pelos negros após a abolição da escravatura em Barbados em 1834.
“Há muitos benefícios econômicos na digitalização do processo de pesca e ele também nos dá a oportunidade de incluir pessoas que foram excluídas no passado”, destaca Cox. “A nova tecnologia nos permitirá documentar o conhecimento tradicional local, como a construção de barcos e a confecção de redes, e integrá-lo a dados, análises e ciência.”

Conversão de sargaço em energia sustentável

A elevação da temperatura do oceano está acelerando a propagação do sargaço - uma espécie de alga marrom e viscosa que está cobrindo as praias, sufocando os recifes de corais e colocando em risco o turismo e a indústria pesqueira do Caribe.
Mas onde alguns veem uma ameaça tóxica, Legena Henry vê uma solução para o desafio energético de Barbados. Como fundadora e CEO da Rum & Sargassum, Inc., uma empresa de biocombustíveis que nasceu a partir de resultados de pesquisas gerados no Laboratório de Desenvolvimento de Energia Renovável da Universidade das Índias Ocidentais, ela está desenvolvendo maneiras de produzir combustíveis para o transporte a partir de fluxos de resíduos locais de baixo custo, incluindo águas residuais de destilarias de rum e o sargaço. Sua pesquisa mostra que o biometano dessas fontes pode produzir combustível para o transporte e evitar até um milhão de toneladas métricas de emissões de CO2 em Barbados. A patente é esperada ainda este ano.
“A energia renovável é importante”, diz Henry. “Ainda não temos o que precisamos, e com as mudanças climáticas acontecendo tão rapidamente , estamos diante de um barril de pólvora. Soluções melhores podem salvar a cultura, criar novos empregos e reduzir o custo de vida.”
Uso de dados para projetar casas resilientes ao clima
Alyssa-Amor Gibbons se considera uma “arquinheira” – alguém que projeta edifícios ambientalmente conscientes, energeticamente eficientes e resilientes. É um título que ela adaptou para se encaixar no seu trabalho de arquitetura em Barbados e no Caribe, e sugere um futuro muito diferente para o ambiente construído da região. Um passo importante para esse futuro, segundo ela, envolve tecnologia de ponta como inteligência artificial (IA), o uso de dados e de gêmeos digitais para a construção civil.
Mas países pequenos como Barbados dependem de dados de uma forma diferente de nações maiores e mais ricas, de acordo com Gibbons. “Não temos acesso a grandes reservas financeiras para fazer as mudanças de que precisamos. Portanto, temos que contar com o que está disponível para nós nesta era digital, para começar a eliminar o processo de tentativa e erro nas soluções que precisamos implementar”, acrescenta. “Os dados gerados pelas novas tecnologias nos permitem fechar a lacuna entre os recursos que temos e a grandeza das soluções que precisamos implementar.”

Gibbons, que fez um TED Talk sobre a criação de edifícios resilientes ao clima em janeiro de 2023, conta com essas tecnologias digitais para criar casas, espaços cívicos e urbanos em cenários virtuais para testar referências de eficiência energética. Quando um edifício atinge suas metas de resiliência, a economia de custos é significativa e o desempenho geral do edifício é mais sustentável em tempo real, bem como ao longo de seu ciclo de vida projetado, diz ela. Isso é “incrivelmente importante” porque “em Barbados, um pequeno país que busca resolver alguns problemas muito grandes, pequenos números importam.”
Oferecer ESPERANÇA a quem compra sua primeira casa

A demanda por moradia acessível e resiliente ao clima em Barbados está crescendo juntamente com a necessidade do país de fontes de energia renováveis. Um projeto patrocinado pelo governo encontrou uma maneira de atender a ambos os requisitos. A HOPE Inc. (Home Ownership Providing Energy - Casa própria fornecendo energia) está por trás do trabalho de construção de casas movidas a energia solar que possam resistir a furacões, e oferece essas casas a quem está comprando seu primeiro imóvel a preços abaixo do mercado. É por isso que Tony Hoyos, Diretor Executivo de Projetos da HOPE Inc., ama o seu trabalho.
Hoyos se juntou à HOPE Inc. para ajudar as pessoas que de outra forma não se qualificariam para um empréstimo a encontrar um lugar seguro para chamar de lar. Os coordenadores do projeto encontram credores para os proprietários em potencial, processam o empréstimo online e negociam todas as taxas, reduzindo os custos de transação. Os proprietários recebem o terreno gratuitamente e dão permissão para a HOPE Inc usar o telhado da casa por 20 anos para gerar energia solar. A HOPE Inc. então vende a energia para a concessionária nacional.
“Sentamos, fizemos os cálculos e percebemos que a receita da eletricidade gerada nesses telhados ao longo de 20 anos cobriria mais do que o custo do terreno que estamos doando, e também as obras civis e os sistemas fotovoltaicos”, disse Hoyos. A água da chuva também será coletada e pequenas estações de tratamento construídas na propriedade processarão toda a água residual de acordo com os padrões agrícolas, para que as fazendas possam usá-las para cultivar vegetais e plantações. O governo pretende usar a receita da energia verde gerada para levantar títulos verdes para pagar os custos de desenvolvimento do terreno e comprar outros terrenos para expandir ainda mais o projeto.
“Damos patrimônio a pessoas que nunca tiveram a chance de possuir um pedaço da ilha. Isso cria estabilidade e oferece a primeira oportunidade de riqueza intergeracional.”

O projeto é o primeiro desse tipo em Barbados, e Hoyos acredita que os benefícios ambientais são igualados apenas aos benefícios sociais. “Sempre nos lembramos para quem estamos construindo”, diz. “Damos patrimônio a pessoas que nunca tiveram a chance de possuir um pedaço da ilha. Isso cria estabilidade e oferece a primeira oportunidade de riqueza intergeracional.” Dez mil casas estão planejadas para os próximos cinco anos.
Democratizar a tecnologia para enfrentar a escassez hídrica
Quando Karl Payne voltou para Barbados no ano passado, após uma década no exterior, ele teve uma sensação de déjà vu. Durante seu tempo fora, ele recebeu seu Ph.D. em engenharia civil na área de gestão de recursos hídricos e trabalhou no setor privado nos EUA, usando tecnologia para inovar em soluções relacionadas à resiliência climática.
De volta a Barbados, percebeu que o país ainda lutava contra a escassez hídrica, o abastecimento intermitente e questões de qualidade da água—os mesmos problemas de recursos que traziam aborrecimentos aos moradores quando ele era criança. Mas os efeitos em cascata das mudanças climáticas significavam que as consequências – como a entrada de água salgada nos poços, resultado da elevação do nível do mar e de chuvas mais extremas – exigiam soluções urgentes. Payne, agora palestrante universitário e coordenador do programa de gestão de recursos hídricos da Universidade das Índias Ocidentais-Cave Hill no Centro de Gestão de Recursos e Estudos Ambientais, está buscando abordagens a partir de modelagens baseadas em dados, inteligência artificial (IA) e pensamento sistêmico para desenvolver políticas baseadas na ciência para Barbados e outros pequenos estados insulares em desenvolvimento.

“A democratização de ferramentas de IA, como aprendizado de máquina, juntamente com a computação em nuvem, nos permite desenvolver modelos sofisticados e prever situações como a alteração do nível da água em resposta à chuva”, explica. “Podemos treinar os modelos de IA para reconhecer um determinado cenário climático e, então, isso pode nos dizer quanto conservar, quais políticas podem ser mais eficazes e até mesmo como quantificar a água não faturada. Essas ferramentas finalmente nos permitirão abandonar a abordagem ad-hoc, responsiva e reativa aos problemas com recursos hídricos.”
Leia aqui sobre “Roofs to Reefs”, o plano nacional de resiliência climática de Barbados, que emprega uma ampla variedade de programas para a comunidade e políticas nacionais para salvaguardar o futuro de Barbados.
Publicado em junho de 2023